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06/08/20

STJ AUTORIZA A PENHORA DE QUOTAS SOCIAIS DETIDAS PELO DEVEDOR EM EMPRESA QUE ESTÁ EM RECUPERAÇÃO JUDICIAL

Fernando Galucci

O credor de dívida particular de sócio pode penhorar as quotas sociais detidas por esse último em empresa que está recuperação judicial, sem que isso implique em desrespeito à affectio societatis e desde que atestada a inexistência de outros bens passíveis de penhora.

Foi com base nesse entendimento que, em 23.06.2020, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) negou provimento ao Recurso Especial nº 1.803.250/SP movido por dois devedores contra acórdão do Tribunal de Justiça de São Paulo. Esse acórdão foi proferido em ação de execução de empresa credora que obteve a penhora das quotas detidas por esses devedores em duas empresas que se encontravam em recuperação judicial, com plano já aprovado.

Os devedores alegaram, em síntese, que a penhora das quotas acarretaria no ingresso de pessoas estranhas aos quadros sociais, em prejuízo da affectio societatis, como também que, estando as empresas em recuperação judicial e tendo sido aprovados os seus planos de recuperação, somente mediante a aprovação em assembleia de credores é que se poderia proceder a alterações desse tipo. Além disso, alegaram também que a penhora colocaria em vantagem credor particular alheio à recuperação judicial, em detrimento dos demais credores que a ela se submetem.

Os Ministros Ricardo Villas Bôas Cueva, Moura Ribeiro e Nancy Andrighi negaram provimento ao recurso, vencidos os Ministros Marco Aurélio Bellizze e Paulo de Tarso Sanseverino.

Embora haja a unanimidade na Terceira Turma pela possibilidade de penhora das quotas sociais de sociedade empresária por dívida contraída pelo sócio, a divergência se deu em relação à possibilidade de penhora quando a sociedade se encontra em recuperação judicial.

O Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, cujo voto prevaleceu, entendeu que a penhora deveria ser admitida especialmente em razão de não haver vedação legal à medida. Ressaltou que, nos termos do art. 789 do Código de Processo Civil (“CPC”), o devedor responde por suas obrigações com todos os seus bens, aí compreendidas as quotas sociais. Além disso, não haveria, em princípio, exceção para o caso que envolvesse empresa em recuperação judicial.

O Ministro ressaltou que, uma vez efetivada a penhora, o art. 816 do CPC determina que se ofereçam as quotas para aquisição pelos demais sócios, que poderiam, dessa forma, evitar a liquidação ou o ingresso de terceiros. Não havendo interesse dos demais sócios, prossegue o Ministro, a possibilidade de aquisição passa para a sociedade, o que se mostra inviável em caso de recuperação judicial, em razão de não haver, em princípio, saldo de lucros ou reservas disponíveis para essa aquisição, nem ser possível a alienação de bens do ativo permanente para cumprir a obrigação sem autorização judicial.

O Ministro destaca, em seguida, que o CPC possibilita o alongamento do prazo para o pagamento do valor relativo à quota nas hipóteses em que houver risco à estabilidade da sociedade. Desse modo, o juiz da execução poderá ampliar o prazo para pagamento, a depender da fase em que estiver a recuperação judicial, aguardando o seu encerramento.

Conclui, por fim, entendendo pela inexistência de óbice à penhora das quotas de empresa em recuperação judicial:

“Assim, parece não existir vedação legal, ao menos a priori, que obste a penhora de quotas de sociedade em recuperação judicial, tendo em vista a multiplicidade de situações que podem ocorrer no prosseguimento da execução.
(…)
Assim, eventual interferência da penhora de quota social na recuperação judicial da empresa deve ser analisada com o decorrer da execução, não podendo ser vedada desde logo, podendo os juízes (da execução e da recuperação judicial) se valerem do instituto da cooperação de que trata do artigo 69 do Código de Processo Civil de 2015.”

Já conforme o voto vencido do Ministro Marco Aurélio Bellizze, a eventual alienação ou liquidação das quotas sociais não se reverteria em favor do patrimônio da empresa recuperanda, mas somente de um credor particular do sócio, não atendendo aos interesses da recuperação. Isso implicaria no prejuízo de diversos credores que se submetem à recuperação e em favorecimento indevido a credor particular do sócio:

“Sem descurar dos interesses do credor particular do sócio, que, como visto, em situação de normalidade da atividade empresarial, possui respaldo legal quanto à pretensão de fazer incidir a penhora nas quotas sociais do devedor, a situação de crise financeira da sociedade empresarial, submetida à recuperação judicial ou à falência, enseja, por determinação legal, a proteção do patrimônio social, a fim de dar consecução aos propósitos de soerguimento, bem como a prevalência dos interesses dos credores concursais.”

Com todo o respeito ao entendimento do Ministro Bellizze, as quotas sociais não compõem o patrimônio da sociedade em recuperação judicial (mas sim dos seus sócios), motivo pelo qual o entendimento que acabou prevalecendo conduzido pelo Ministro Cueva nos parece o mais correto e razoável, à luz da legislação aplicável.

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Fernando Galucci 

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